Conheça o canal Diário de um autista e as coisas que todo autista gostaria que você soubesse

Conversamos com o Marcos Petry sobre estereótipos, noções diferentes de masculinidade e a importância de falar sobre a condição

Uma das coisas mais bonitas da internet é a oportunidade de conhecer mundos que se distanciam do seu.

O cotidiano de vidas em países distantes acompanhadas pelas redes sociais, músicas que nunca imaginou descobrir, receitas para fazer pratos que fogem da culinária típica da sua região, um sujeito que vive e exerce sua noção sobre o que é ser homem de uma maneira de maneira diferente da sua. A lista é enorme. E, de alguns anos pra cá, podemos colocar nela as mais inimagináveis coisas apresentadas em diferentes vídeos e canais do YouTube.

Se a moda de ser youtuber torce o nariz de muitos pelos temas abordados, em alguns momentos temos de agradecer por ela existir. Criar um canal de vídeos é uma oportunidade para que pessoas ganhem amplitude no que têm a dizer, mas também nos dá a chance de ouvir vozes e falas que costumam ser abafadas pelos ruídos do dia a dia.

É o que sentimos ao acompanhar os vídeos de Marcos Petry, criador do Diário de um autista, que abriu seu canal há dois anos para falar mais de sua condição e dos temas que norteiam esse universo.

O resultado são vídeos incríveis, que jogam luz no tema de uma forma poucas vezes feitas pela mídia. Inúmeros são os agradecimentos de pessoas que, com maior ou menor relação direta, procuram o tema e caem nos vídeos abaixo.

O vídeo a seguir, Coisas que todo autista gostaria que você soubesse, foi descoberto e logo se espalhou pela equipe do PapodeHomem, rendendo elogios e, claro, esse texto.

Resolvemos então procurar o Marcos, escutar dele como tem sido a experiência de produzir esse tipo de conteúdo e perguntar para ele como foi se entender e lidar com o autismo em relação ao que se espera do homem na nossa sociedade. Esse papo colocamos abaixo, na íntegra.

1. RedaçãoPdH –Pode, antes de mais nada, contar um pouco mais de você, por favor?

Marcos –Sou Marcos Petry, tenho 24 anos, moro em Vidal Ramos, Santa Catarina. Tenho graduação  em Comunicação , pós-graduação em Design Gráfico e Produção Publicitária. Sou escritor, radialista, palestrante,  instrumentista e cantor nas horas vagas. Gosto de tocar guitarra, violão e teclado. Falo inglês, alemão e espanhol.  

Tenho uma lesão cerebral, e por volta dos oito anos de idade descobri ser autista. Considero a música e a linguagem duas vias importantes para ressaltar a diligência humana… Foi através destas que tenho estabelecido metas, conhecido e desafiado meus limites. Diligência é a base para meus projetos.

2. RedaçãoPdH – O que te motivou a criar o canal? Como tem sido a experiência?

Marcos – Criei o “Diário de um Autista “  porque sentia que as discussões no entorno do autismo eram muito escassas e, quando ocorriam, pautavam-se em coisas científicas demais! As pessoas e os meios de comunicação pareciam se preocupar mais em identificar as manifestações do espectro autista do que ressaltar a vivência do indivíduo autista; suas potencialidades, desafios, esperanças.

Além disso, percebi o poder e a projeção que tem a internet quando se trata de disseminar ideias. Me ocorreu que poderia fomentar  a participação do autista e trocar experiências a respeito de como tornar isso possível.

3. RedaçãoPdH – Nos comentários, são inúmeros os agradecimentos ao seu trabalho. Que importância você enxerga em existir tal conteúdo, abordando o tema com esse esmero?

Marcos  Acredito que os conteúdos do canal são importantes para desmistificar mitos como “O autista gênio”, “O autista burro” ou “O autista incapaz”, ao mudar a postura das pessoas com relação a isso, convido-as a enxergar outras perspectivas: incluir, participar da sociedade, construir a consciência coletiva.  

Cada conteúdo, antes de figurar nas estatísticas do YouTube, é um assunto de conhecimento de quem visita meu canal ou algo requisitado.  Os mitos que comecei a analisar e discutir, hoje percebo, já não são mais recorrentes, pois deram lugar a possibilidades. Posso me considerar influenciador digital e quem assiste os vídeos passa tal influência adiante. Os conteúdos acabam se tornando providenciais em diferentes grupos: família, escola e comunidade em geral, servindo de incentivo à neurodiversidade.

4. RedaçãoPdH – O PapodeHomem fala muito sobre outras possibilidades para as masculinidades, mas ainda há um modelo clássico de homem que privilegia força física, não falhar, não chorar. Como foi se entender e lidar com o autismo em relação ao que se espera/se cobra do homem na nossa sociedade?

Marcos – Lidar com as referências de masculinidade no cotidiano não foi fácil, o entendimento disso junto ao autismo me deixou inseguro por conta do entendimento literal das coisas.

Vi-me preso a rotinas machistas, chauvinismo, bebedeira e a desvalorização da mulher, pensei que mais cedo ou mais tarde estaria sufocado, mas vi em meu pai um amigo sensível e conselheiro, que deixou transparecer todos os nuances que não via nos colegas da escola e do bairro. Tivemos muitas conversas.

Mais tarde realizei alguns estudos e percebi o fator “ator social “ que há nas pessoas. No caso dos homens, notei que muito do que me afligia não passava de atuação, que a masculinidade clássica tem seu valor quando alocada no lugar e sob as circunstâncias certas. Quando evidenciada a força física por exemplo, ela deve ser usada para o bem, com diplomacia e parcimônia, sempre que a situação pedir (para ajudar uma mulher que está sendo importunada, para separar uma briga ).

A pulsão tipicamente masculina está em nosso meio, mas vai se lapidando para ter um propósito. Assim pode-se começar aos poucos a dissociar “masculinidade “ e “machismo”. Uma das coisas que meu pai me ensinou em nossas conversas, e que trago à luz para esta questão foi ter responsabilidade por meus atos. Isto é que move minha masculinidade na direção do respeito, da paz e da diplomacia. A serviço destas ideias eu ponho as pulsões classicamente masculinas, principalmente a sagacidade e a força.

É bonito ver outros exemplos de masculinidade, de conteúdo benéfico, ganhando luz. 

Natura Homem acredita que existem tantas maneiras de exercer as masculinidades quanto o número de homens que existem no mundo. Sem modelos a serem seguidos, sem colocar ainda mais pressão sobre os nossos ombros.

As nossas verdades, os nossos ritmos, os nossos jeitos de ser e estar no mundo. Seja homem? Seja você. Por inteiro. Natura Homem celebra todas as maneiras de ser homem.

Fonte: papodehomem

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